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Posted by caramelo77 on

Raquel Uendi – Ɐ

2016

TEXTO (POR)

O desenvolvimento do projeto desta exposição com a artista Raquel Uendi fez com que eu voltasse mais uma vez às entrevistas do artista Cerith Wyn Evans com o curador Hans Ulrich Obrist, reunidas no livro “Hans Ulrich Obrist & Cerith Wyn Evans: The Conversation Series – Volume 24”, bibliografia esta que aparece com muita frequência como referência em minhas pesquisas e textos.

Nestas entrevistas o artista Cerith Wyn Evans apresenta em vários momentos uma análise sobre seu processo de criação, a partir de reflexões que acho extremamente interessantes e importantes para serem conectadas com a produção de Raquel Uendi. A partir desta reflexão sobre seu processo criativo, Certih também problematiza constantemente a imagem e seus desdobramentos, por um viés filosófico – questão-chave presente no trabalho de Raquel.

Cerith parece revelar ao longo de sua fala um apreço pela ideia de subversão. Algo que ele aponta ter sido alimentado e aprofundado ao longo de sua vida a partir de algumas experiências, mas mais particularmente pela sua relação com outros artistas que também produziam a partir desse modus, personas non gratas, aparentemente errantes e complexas.

Raquel para mim também sempre representou essa ideia de subversão. Eu era jovem e lembro-me de vê-la de longe na noite. Sua figura me despertava um misto de desejo e medo. Éramos de gerações diferentes, mas naquele determinado contexto, ocupávamos o mesmo espaço-tempo, a mesma cena. Algum tempo depois acabamos nos aproximando e entendi o que eram para mim aquelas sensações – desejo e medo era a mesma coisa – Raquel pulsava liberdade e transgressão. A artista era este tipo maravilhoso de persona non grata, que me causava também uma real admiração. O mesmo tipo de admiração que podemos perceber no discurso de Cerith quando o mesmo comenta sobre essas figuras paradigmáticas que fizeram parte de sua formação.

Para Cerith, a arte deve ter certa perversidade, conter um tipo de agressão. Para mim Raquel trabalha a partir desta lógica. Tanto na forma como a artista cria uma disrupção com o estatuto da imagem, de alguma maneira desautorizando a imagem, como se cometesse uma espécie de crime ou golpe, chegando a parecer até um tanto “irresponsável” ou “inconsequente”, quanto na forma como apresenta seu trabalho.

Existe uma política da subversão no trabalho de Raquel, além dessa perversidade e/ou agressão – pulsões essas inerentes a ela e que se revelam esteticamente de maneiras muito sutis, mas extremamente potentes, como extensões de sua própria subjetividade. A materialização de seu processo revela seu modus operandi com a vida.

Poderíamos realizar uma metáfora aqui, no sentido que essa sutileza se dá quase como quando cortamos o dedo com um caco de vidro ou como quando alguém é apunhalado silenciosamente por uma faca.

Sobre esta forma de lida com a imagem, me remete também ao conceito de “violência” levantado por Cerith Wyn Evans. Ele reflete que no ponto em que uma imagem se encontra com outra, se instaura um estado de perturbação. Um local de trauma, algo que ele analisa por um viés foucaultiano como a reafirmação da estrutura original da imagem através de sua ruptura, do seu dilaceramento, da sua colisão, da sua “ícono-colisão”, rumo a outro espaço. É uma crítica da representação. Uma crítica da imagem num âmbito intelectual. Para ele o trabalho deve conter essa disposição para distorcer, provocar um curto-circuito ou arruinar completamente com seu significado.

Para mim aqui está também uma camada importante presente no trabalho da artista. Ao especializar a imagem, Raquel complexifica estas questões que não se dão mais apenas no contexto bidimensional, mas vazam para a experiência do corpo. Em suas instalações a artista cria espaços que eu gosto de pensar como zonas. “Ambientes estranho-familiares”. Nestas zonas o espectador entra em contato com as imagens-fraturas criadas pela artista. Existe uma narrativa criada a partir de grandes espaços de dúvidas. Os diálogos presentes nesta narrativa são como uma gagueira beckettiana. Nestes ambientes, podemos perceber um tom erótico-melancólico e um caos controlado. Raquel também expõe uma questão de ambivalência. Essa aparente força punk presente em seu trabalho ao mesmo é extremamente frágil, estilhaça, quebra, corta e a artista explora isso formalmente.

Agora, para além de todas essas camadas presentes na produção da artista, a meu ver o trabalho de Raquel ainda levanta uma questão maior – em um momento em que na arte, assim como na vida como um todo, existe uma logomania da explicação, tem coisas que não precisam ser explicadas. Esse vão é muito político. Afinal o que significa um “A” invertido? Na matemática o (“a invertido”) é o quantificador universal, ou como os próprios matemáticos costumam dizer: “qualquer que seja…”.

Bruno Mendonça

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